terça-feira, 6 de dezembro de 2011

O FIM DE UM SONHO

O FIM DE UM SONHO.
Trajetória Cultural do Cineclubismo em Linhares/ES

Era uma final de tarde de 19 de maio de 2008, quando nos reunimos na Avenida João Calmon no Município de Linhares, éramos catorze jovens pensando a reflexão através do cinema, o encontro com a sétima arte. Queríamos promover não só o acesso ao cinema, como o encontro real das comunidades com ele. As comunidades iriam organizar suas próprias sessões de cinema, escolher os filmes após as exibições, promoveríamos um debate em torno do cotidiano popular, suas lutas, angústias, a vida popular diante do imaginário do próprio povo. Assim nasceu o Cineclube Juparanã.

Estávamos eufóricos com a possibilidade, nos filiamos ao Conselho Nacional de Cineclubes, tínhamos a possibilidade de fazer grandes ações no Município. Realizamos Sessões de Cinema em algumas Escolas, Oficinas de Formação Cineclubistas e Edição de Vídeos nas comunidades de Povoação, Pontal do Ipiranga e Regência.

Lembro-me quando aprovamos o Projeto na Lei Lastênio Calmon, teríamos recursos para construir uma estrutura para o nosso sonho, e poderíamos contratar estagiários da Rede Pública de Ensino, o sonho abriria janelas para outros sonhos, mas que ao passar do tempo e dos anos se diluía pela ilusão. Nós nunca recebemos os documentos de bônus da Lei para captarmos recursos, tanto pela irresponsabilidade da Gestão Municipal na época quanto pela não continuidade e desejo de uma solução da Atual Gestão, e assim foi se diluindo e passando os dias de nossa trajetória, com a falta de apoio os jovens foram se dispersando, o sonho resistiu aos anos, mas não se materializou na realidade das falsas promessas e se perdeu pelo espaço do tempo, se resguardando apenas em nossas doces e amargas lembranças.

O Cineclube criado em Linhares, nunca teve o apoio e reconhecimento, quando do Projeto aprovado, meu olhos se encheram de água, era nosso primeiro projeto e a possibilidade realizar grandes ações, com estrutura e recursos humanos.

O tempo passou,  ao longo dos anos, realizamos Oficinas, Exibições em Escolas e em algumas Comunidades, realizamos a Mostra Cineclubista da Região Norte do ES; participamos da Jornada Nacional de Belo Horizonte e Recife, da Conferência Mundial de Cineclube em Recife, de duas edições do Festival do Audiovisual Internacional de Atibaia-SP.

O Movimento Nacional de Cineclubes sempre teve um olhar por Linhares, chegamos a propor a realização de um Encontro Estadual de Cinema, tínhamos a pretensão de estimular a criação de Circuitos Populares de Cinema no Município, além de um Circuito de Produção de Filmes na Rede de Educação, buscando resgatar a cultura através do cinema pelos próprios estudantes. Mas nunca fomos ouvidos, ou se fomos, as palavras entraram por um ouvido e saíram pelo outro.

Entre tantos fatores, o que mais nos deixa chateado, é ver a realização de ações que visam mais o voto popular e o status social do que o real desenvolvimento da cultura no âmbito popular. Quando faço esta crítica, não falo das diversas manifestações, que são muitas. Algumas poucas ainda atingem a participação do povo em massa, mas ambas carecem da vertente política, política quando tratamos de um debate em torno de políticas públicas para o processo cultural no Município.

Algumas vezes propomos a realização de um Fórum Municipal de Cultura, mas parecem temer a opinião e o encontro com o povo, parecem preferir o olhar individual na escrivaninha ao abraço das massas em torno da tela.

A melhor forma de preservamos a história e a cultura, vai além da boa estrutura, da bela praça, pois até os monumentos envelhecem com o tempo. 
A melhor forma é levarmos para as Escolas não só os eventos culturais, mas possibilitar um olhar não de nossos olhos para as escolas, mas da escola ao reflexo de nosso olhar. Realizar Oficinas, incentivar tanto a escola quanto o povo a produzir cultura, é o melhor caminho para o desenvolvimento cultural. 

Mas ao que mais parece ainda reina o coronelismo e as obras individuais, pois os poderes públicos ainda temem a consciência popular.

Em 2008 buscamos o aparato e abraço do Departamento Cultural de Linhares, a Secretaria Municipal de Cultura, algumas vezes cometemos a falha do elogio precipitado, a pura verdade dos fatos é que nunca tivemos um real apoio que ficou apenas na boa palavra da promessa, em algumas poucas intervenções e apenas tivemos o aperto de mão nos momentos em que fomos destaque e diante dos olhares do povo. Pois quando propomos uma real parceria, ela esbarrou nos dogmas da burocracia e nos âmbitos pessoais, que diga-se de passagem ficaram apenas na troca de elogios, pois o fato a Atual Gestão Cultural do Município, apenas sempre alegou a falta de recursos humanos para realização de um Polo Cineclubista, uma desculpa simplista, pois a verdade é a que sempre preferiram a realização de Exibições no Moldes do Cinema na Praça, pelo fato de ser esta uma ação alicerçada na politicagem, na vitrine de ações, e que sempre manteve a ação com uma Bandeira Maior do Individualismo, do que eu fiz, do estamos fazendo, tão embora, esta ação não tem raiz nenhuma na escolha do filme ou no debate sobre o cinema como expressão popular.

Gestão Cultural não se faz de uma forma elitizada e nem com realizações pessoais, mas se faz buscando o desenvolvimento popular da cultura. A promoção do acesso ao bens culturais é incompleta senão houver a real participação do povo no que é concepção de cultura. A carência da consciência de política pública e visão política das Gestões Municipais.

Por Linhares meu enorme carinho, pelos amigos que fiz na Jornada por esta estrada as margens do Rio Doce, meu saudoso reconhecimento e boas lembranças.

No entanto, meu repúdio por perceber a carência de ações que busquem alçar a voz popular do público e descobrir apenas a intenção da vitrine de atividades para justificar a não realização do canto cultural do povo. Vendeu-se os títulos das ações mas não se comprou o real desenvolvimento cultural e social.

Surge dai um dos fatores da proliferação da violência e o assassinato de jovens nas vielas da vida no Município. A falta de políticas públicas e sociais com participação direta da voz popular voltadas para a juventude e formação do cidadão.

Uma nação sem o desenvolvimento de sua cultura encontra a ilusão de seu progresso. Uma sociedade que aparelha muito mais quem pune do que quem educa se torna doente. Quando Linhares terá um real desenvolvimento de sua cultura nos âmbitos estudantis e na juventude? Quando terá um debate que ouvirá a massa popular e dará espaço para a manifestação popular? Quando a Secretaria Municipal de Cultura irá promover um desenvolvimento cultural desvinculado do palanque político e eleitoreiro?

São perguntas que corrompem a minha alma e cortam-me o coração.

O ápice do teatro da vida, não são as cenas que passam, e nem tão pouco a cena diante de nosso olhar quando o teatro busca se representar diante da platéia. A grande e intensa jogada, é quando se permite que nós, o povo, sejamos autores de nossa própria história.

Enfim, chegamos a 2011, três anos após a reunião daqueles jovens na Avenida João Calmon, quando pensamos em promover um olhar de nossa realidade e a voz popular diante do cinema, e o sonho de promover a produção de filmes por nosso próprio povo, resgatando e produzindo cultura.
Mas no infeliz desfecho da trama, perdemos o caminho dos sonhos e chegamos ao amargo fascismo  entre a promessa e a realidade.

No findar deste 2011, a última cena do filme é a extinção do Cineclube Juparanã a qual remeto ao Conselho Nacional de Cineclubes, na certeza de que a Secretaria Municipal de Cultura, que foi nossa maior esperança, na certeza  de que a Secretaria não pretende mesmo desenvolver o cineclubismo, quer seja pelas justificativas da falta de recursos humanos, quer seja pela falta de entendimento da enorme diferença do cineclubismo e o Projeto Cine Itinerante que atua nos moldes do Cinema na Praça, que carece tanto da consciência política quanto a formação cultural e social e torna o cinema um palanque de status político e eleitoreiro.

Quer seja pela realização de uma Gestão Pública Cultural engessada, elitizada e centralizada, que apenas se utiliza das manifestações sociais e culturais para fins políticos e o povo que produz cultura como exposição para uma Elite Social que tanto nos desmerece e não consegue compreender uma só nota ou acorde de nosso canto.

Nos momentos pertinentes os meus sinceros aplausos para a Secretaria Municipal de Cultura a Gestão Municipal, mas minha devida crítica quando faz-se necessário o meu grito quando o meu coração sofre e sangra, tanto por abrir os olhos e ver a verdade encoberta, como pelo fogo amigo e a falácia do sol da promessa.

Hoje não é só o fim do Cineclube, é o fim de um sonho, do imaginário de ver o filme rodando na tela e sendo o caldo para revoluções culturais, de ver o encontro do cinema com o público cidadão, na busca pelo debate do desenvolvimento de condições dignas de vida e olhar sob nosso cotidiano popular. Infelizmente a Gestão Cultural do Município de Linhares segue o modelo da exibição descompromissada com a formação de público e a formação do cidadão. Não só a Gestão Cultural, mas diversas ações carecem de uma política pública de formação social e a busca de um olhar para com os jovens e as comunidades.

Morre o Cineclubismo, morres os sonhos, como tão logo vão morrendo nossos jovens e nossa cultura dando lugar a cultura do consumo e da corrupção, do descaso com que é público e o descompromisso com a formação de uma sociedade alicerçada na democratização do acesso pela maioria ao direito de voz, direito pela vida, e direito de acesso aos bens culturais e sociais. Desta forma, todo desenvolvimento alcançado é a pura falácia da ilusão, um desenvolvimento que sempre será para poucos e incompleto.

Minhas sinceras argüições, meu breve relato sobre os últimos anos e o fim do filme na tela que já alcança e projeta os créditos finais, oras sem créditos e descréditos, a verdade precisava ser gritada.

Basta o silêncio, a oração dos sábios.

Eu Luciano Guimarães de Freitas, Fundador do Cineclube Juparanã, único remanescente daqueles jovens que fundaram o Cineclube no dia 19 de maio de 2008, Diretor de Relações Institucionais, do Cineclube , venho a público manifestar o fim e a dissolução do Cineclube Juparanã, bem como sinceramente, reconheço o não apoio e desejo da Gestão Cultural do Município em desenvolver ações cineclubistas. Mas simples assim, apenas estão interessados no palanque político, o qual eu não me ateio a fazer parte.

As justificativas para mim são pura falácia de quem se ampara nos Status Social e no Conhecimento Individual. Resultado: Fomos iludidos pelo bom cordeiro.

Assumo publicamente, os meus erros e minha fé precipitada de tal e igual forma. Acreditamos demais...

É com o coração sangrando, os olhos emaranhados de água, que reconheço o fim do Cineclube no Município de Linhares.


Por Luciano Guimarães de Freitas
Militante do Movimento Nacional de Cineclubes desde 2004
Fundador do Cineclube Juparanã

lucianoprodcultural@gmail.com
cineclubejuparana@gmail.com